sexta-feira, 22 de abril de 2011

Vou não, quero não, posso não, minha ética não deixa não.

Bom... vamos lá.
Sabe quando você tenta estabelecer prioridades e achar um lugar por onde começar a organizar as idéias? Pois bem, estou nesse ponto exato. O pior é que acabei de fazer um minicurso online sobre Atenção Concentrada. Acho que ele não adiantou de porra nenhuma.
Há umas duas ou três semanas, resolvi dar uma limpeza total na minha alimentação. Não só por aspectos nutricionais, mas também pelo ponto de vista ambiental e ético. Comecei a achar um contra senso eu ainda aceitar certos produtos que são completamente contra ao que aprendi (e sigo aprendendo) como recomendado. E se eu, que tenho a informação, não me modifico, como eu vou querer sensibilizar um leigo a ter um comportamento "saudável"? Não consigo mudar muitas coisas aqui em casa, porque minha mãe não tem o costume de me ouvir, mas eu faço o que todo consumidor consciente faz: boicote. Vocês não tem noção da quantidade de chocolate dando sopa por aqui, e eu comendo alface e camarão. Eu tô super bem, tenho certeza do que quero.
Estou como uma iniciante na arte de me conhecer. Descobrir com que alimentos o meu corpo sofre, e que coisas podem me ajudar a contornar meus problemas. Estou em tratamento de choque, digamos, mas estou muito obstinada, tendo certeza de que está fazendo bem ao meu espírito.
Com isso, tenho me indignado com muitas coisas. Na verdade, tudo isso começou há um mês ou um pouco mais, quando fui a uma palestra do Inca, promovida pelo Inad. Ao final, o palestrante mostrou as semelhanças da estratégia de marketing da indústria do cigarro e da Coca cola, desde os primórdios. Ambos se utilizaram das mesmas coisas: imagem de credibilidade por médicos, artistas e esportistas, exploraram a segunda guerra, além dos elementos mais comuns, de promover status a quem fuma ou bebe refrigerante.
Foi a Coca Cola que criou o Papai Noel tal como o conhecemos hoje. O antigo Santa Klaus era magrelo e usava roupa verde. A empresa, então, pediu que se elaborasse a imagem do bom velhinho com as cores da sua marca. Aquele carinha, de bochechas rosadas e roupa vermelha, não é o original, mas a Coca Cola o transformou no oficial.
Acabei 'garrando um ódio da empresa e de toda essa aura de boa moça que ela carrega em suas propagandas desde que me entendo por gente. Até que o palestrante falou algo bem interessante. Ele disse que, há vinte anos atrás, se você pedisse para alguém apagar um cigarro, ia ser algo bem estranho, e certamente essa pessoa ia se recusar. Hoje, o fumo deixou de ser algo completamente descolado, e passou a ser considerado por todos como um comportamento de risco. E, quem sabe, daqui a alguns anos, um adulto não tenha vergonha de tomar um copo de refrigerante na frente de uma criança, por estar incentivando um comportamento não saudável?
Achei uma colocação repleta de esperança. 
Assim como a nova propaganda da Coca Cola, que diz assim:  


Para cada pessoa dizendo que tudo vai piorar, 100 casais planejam ter filhos.
Para cada corrupto, existem 8 mil doadores de sangue.

Enquanto alguns destroem o meio ambiente, 98% das latinhas de alumínio são recicladas no Brasil.
Na internet, AMOR tem mais resultados que MEDO.
Para cada tanque fabricado no mundo, são feitos 131 mil bichos de pelúcia
Para cada arma que se vende no mundo, 20 mil pessoas compartilham uma Coca Cola
Existem razões para acreditar. Os bons são maioria.

O texto é inegavelmente muito bonito, porém, pense comigo, vindo de quem vem, é, no mínimo, hipócrita. Só discordo completamente da frase do meio ambiente, porque todo mundo sabe que a ponta dessa 'coleta seletiva' de latas de alumínio são as pessoas miseráveis que saem catando as latas pelas ruas para arranjar uns centavos e comprar algo pra comer, ou mesmo pra complementar a renda. Não acho que o Brasil deva se vangloriar tanto dessa estatística, se ela se baseia na falta de dignidade de milhões de brasileiros.
Quer ajudar o meio ambiente? Compre menos produtos industrializados. Com certeza, o seu consumo e descarte de latas de alumínio, e outros tipos de lixo, será infinitamente menor. ;-)
Aí é que está. Essas indústrias alimentícias, principalmente essas gigantes, revestem-se de um discurso de responsabilidade ambiental, que na verdade é falso. Fazem esse tipo de campanha, pra aumentar o seu consumo que, consequentemente, vai aumentar a degradação do meio ambiente e do lixo. Dá pra entender?
Agora a Coca Cola diz no que eu devo acreditar? É ela que deve alimentar minhas crenças? Antigamente, isso era papel da Igreja, da fé. Da busca pela paz e pelo conhecimento.
Existem alguns textos na internet que tratam da hidropirataria exercida pela Coca Cola na Índia e a defesa pela preservação da água iniciada pelas mulheres da localidade. Eles usavam a água dos lençóis freáticos em regiões pobres da India de forma indiscriminada, causando um desequilíbrio ambiental absurdo e, como se não bastasse, jogaram os dejetos dessas produção na água que seria consumida pela população. Retirei essas informações de um site que as postou em 2005, mas continua sendo válido:
"Os habitantes", escreve Virender Kumar, jornalista do diário Mathrubhumi, "levam sobre a cabeça pesadas cargas de água potável que eles precisam buscar longe, enquanto caminhões cheios de refrigerantes saem da usina da Coca1". Esta usina bombeia um milhão de litros d'água por dia e às vezes mais. As mulheres são obrigadas a percorrer de cinco a seis quilômetros para buscar água potável, enquanto, ao mesmo tempo, vêm sair da usina entre oito e nove caminhões carregados de refrigerantes. São necessários nove litros de água potável para se fazer um litro de Coca. 
Achou assustadora essa coisa toda na Índia? Lamento te informar, mas isso vem acontecendo atualmente no Brasil, pela exploração da empresa Nestlé. Veja no link o que a Nestlé anda fazendo com a água de São Lourenço.
Há outro aspecto que suja a reputação da Coca Cola como empresa: o monopólio que ela vem exercendo nos últimos anos, e de forma violenta. Ela comprou, dentre outros, a Matte Leão, o Suco Mais, e até o maranhense Guaraná Jesus. Pela internet, você encontra textos de denúncias que, pra mim, não tem nada de impossíveis de serem reais, mais como não aparentaram ser de uma fonte referendada, preferi não colocar aqui.

Bom, e se você já deu Coca Cola pro seu filho, não se sinta ofendido, é só uma reflexão.

E além disso, meu querido leitor, a Coca Cola não tem absolutamente NADA de bom. É água com açúçar e conservantes, e na versão diet, tem os adoçantes em quantidades cavalares. Entre açúcar e adoçante, não me pergunte qual é o pior.
Os refrigerantes tem quantidades elevadas de fósforo, o que promove um desbalanço na relação cálcio/fósforo do seu organismo, ocorrendo uma retirada de cálcio dos seus ossos. Logo, Coca Cola não é um produto pra crianças, pois elas estão em fase de depositar cálcio no osso, e não de retirar. E Coca Cola não é produto pra adultos, pois essa retirada de cálcio enfraquece os ossos e, principalmente nas mulheres, induz à osteopenia e osteoporose.
Além disso, os adoçantes e conservantes dos refrigerantes, e de qualquer produto industrializado, não são e nunca serão substâncias seguras. Ninguém te garante o que realmente acontece no seu organismo quando esses mutantezinhos chegam na sua mucosa intestinal. Já foi provado que indivíduos que consomem maior quantidade de alimentos industrializados tem maior possibilidade de ter câncer de intestino. E também já foi provado que a ingestão de líquidos açucarados, tais como os refrigerantes e sucos de caixinha, tem maior acúmulo de gordura corporal, sendo um fator de risco para obesidade. E a obesidade, por sua vez, como induz a um estado inflamatório generalizado, deixa o indivíduo mais propenso a desenvolver diversos tipos de câncer, além das patologias diretamente associadas, como a hipertensão arterial, diabetes e ateroesclerose.
Um mundo melhor depende muito das nossas escolhas, do que consideramos melhor para a nossa própria saúde, e para o bem estar de toda a comunidade. Prezado leitor, faça o que está ao seu alcance! Não pense que é pouco. Eu não tenho como comprar muitas coisas que são melhores para a alimentação, como os alimentos mais integrais e orgânicos, mas faço o que posso para evitar tudo que é industrializado e desnecessário. Sem soja, sem açúcar, sem adoçante, sem excessos. Já considero que estou dando um grande passo.
Não é questão de consumir a Coca Cola uma vez ou outra, pra não engordar. Não é isso!! É uma questão muito mais profunda, que envolve um massacre da nossa cultura e das nossas preferências alimentares. Não precisamos de Coca Cola para fazer uma festa de aniversário, para um almoço em família ou para sair com os amigos. Você não precisa de Coca Cola para ser feliz. Esse tipo de lavagem cerebral que a bendita globalização faz é gravíssima!!!!!!!!!!
E, se você se interessar mais no assunto, no Nutrindo a Mente também colocar um texto falando também sobre a Coca Cola, enfocando um outro aspecto. Veja aqui.
Não posso compactuar com essas práticas... Estou sendo radical? Talvez... Mas eu só consigo operar minhas próprias mudanças sendo radical. E para resolver males, temos que cortá-los pela raíz.

If you wanna make the world a better place, take a look at yourself and make a change.
(a frase mais multiuso de todos os tempos)

sábado, 16 de abril de 2011

Meu caro amigo

Não nego a existência da seca. Nego seja ela a causa de fenômeno da fome no Nordeste. Como nordestino, como homem da região das secas, como filho de homem do sertão e como neto de retirante da seca de 1877, não nego a existência do fenômeno: é mister, entretanto, que não se explore a questão, dizendo que a culpa de tudo é a seca, quando há outros culpados e mais do que ela. Os males do Nordeste derivam da exploração econômica aí implantada, que fez desta área uma colônia de outra colônia. A princípio, uma colônia de Portugal, explorando colonialmente por outras potências europeias mais fortes e, depois, colônia do Sul do Brasil, explorado colonialmente por várias potências de economia dominante. No Nordeste, a morte é uma tal constante, um fator social de tamanha importância na vida da região, que o que mais prospera aqui são os cemitérios. A maior parte das crianças volta cedo à terra, logo nos primeiros meses de vida, como se estivessem arrependidos de terem nascido em uma terra tão pobre, ou como se não tivessem sido preparadas para uma viagem mais longa. Nascem mais para morrer que para viver, mais para povoar céus como anjos, na consoladora crença de seus pais, do que povoar a terra como homens. Em um lugar onde não é a terra que dá de comer ao homem, é antes o homem que nasce apenas para dar de comer à terra. para alimentar essa terra-cemitério que engorda com sua matéria orgânica. E de que morra tante gente? Morre-se de tudo, mas principalmente de fome. É a fome em seus variados e múltiplos disfarces, o mais ativo dos cavaleiros do Apocalipse que arrasa as populações pobres.
Josué de Castro, em discurso na Câmara Federal, em 1958. 


Caro Josué,
Tanto pensei em lhe escrever, mas a verdade é que as idéias me fogem no momento. Um pouco por vergonha, e em grande parte por minha admiração profunda pela sua pessoa. Seu discurso sempre foi tão alinhado a suas condutas, e isso é tão raro hoje... Infelizmente.
Acho que venho lhe informar do óbvio. A desnutrição e a fome vem sendo paulatinamente vencidas no nosso país, mas ainda assola milhões de pessoas em algumas regiões do mundo, o que não deixa de ser nossa responsabilidade. É até besteira falar isso para o senhor, que foi presidente da FAO!
A desnutrição nos seus indicadores simples vem diminuindo, mas ela vem tomando outras faces, outros disfarces. A transição nutricional agora nos submete a um excesso de alimentos, com muita energia e poucos nutrientes, trazendo a obesidade como o assunto mais discutido no nosso mundo. Mas ainda já a desnutrição não claramente pronunciada: aquela da criança gordinha, com bochechas visçosas, mas anêmica. Síndrome metabólica. Crianças hipertensas. Crianças diabéticas. Sim, Josué, o desafio torna-se cada vez maior.
Digo que o perfil mudou, mas as raízes do problema são as mesmas que estão implícitas nesse trecho de seu discurso. A falta de vontade política, que você conhece tão bem, e outros componentes de ordem social e cultural que mudaram o mundo de forma tão intensa desde que você se foi.
Falta amor ao mundo. Falta compreensão e carinho. Falta ao homem saber o que representa e onde ele se situa. As pessoas não sabem mais que o que elas fazem ou deixam de fazer são uma contribuição ou omissão ao mundo. Fazem as coisas por fazer.
Está todo mundo perdido, e ninguém faz questão de se achar. A ignorância é generalizada em um grau que a minha visão realista me permite dizer que está em um ponto irreversível.
Deveria haver no Brasil a criminalização da banalização. É um troço que ando formulando e pensando por essas semanas. O fato de um indivíduo ou um grupo de indivíduos tratar assuntos diversos de forma volúvel e passageira deveria ser punida.
Novela é um exemplo clássico. Os amores surgem e desaparecem em tempo recorde. O amor é completamente descartável e você tem direito a uns... oito "maiores amores da minha".
Esses programas do tipo "Esquadrão da Moda". Deviam ser proibidos. Uma vez, uma amiga escreveu um post só sobre isso, não vou conseguir achar isso agora, mas pensamos igual. A televisão quer passar pra você, mulher, a noção de que se você tem dez mil reais, um cabeleireiro e uma maquiadora, em dois dias você é uma outra pessoa. Em dois dias, você cria auto-confiança e auto-estima. Essas emoções que são tão íntimas e difíceis de se construir de maneira sólida, o dinheiro vai lá e traz pra você. Bom, não sei o fato de eu   não ser muito feminina me gere essa recusa por esses programas, mas acho que o conceito da coisa está errado desde sempre.
Big Brother Brasil. Ganha um milhão de reais quem consegue fazer intrigas de forma mais engenhosa. Ponto final.
O fato é que já estamos sendo punidos. Quanto mais uma sociedade dita padrões inatingíveis e comportamentos alienantes, o elo mais fraco e mais sensível se quebra, e da forma mais explosiva.
E aí, o que vamos fazer? Vamos colocar detectores de metal nas escolas ou vamos promover uma educação multidisciplinar e acolhedora, que saiba suportar e exaltar as diferenças, pelo bem de toda a sociedade?
Fiquemos com os detectores de metais.
Bom, querido Josué, quero que saiba que ler um de seus livros, há anos atrás, foi inspirador. Situou-me a importância da ciência que resolvi abraçar como profissão. Mas, ao longo desses vinte anos vividos, tenho lá minhas impressões do mundo. Talvez, um pouco distorcidas pelo meu jeito de pensar e meu jeito de ser. É meu viés. E não consigo pensar nutrição sem pensar em amor ao próximo, em ignorância, em poder. Em 2012. Em fim do mundo.
Tudo está interligado. Conto com sua lembrança e inspiração para seguir remando contra a maré every single fucking day.
Um abraço.